sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010


As pessoas se cruzam nas ruas, todo o tempo. Duas pessoas compartilham suas presenças em um momento exato, possivelmente único em suas vidas. Cada qual carregada de informações, anseios, pensamentos, seguindo por um mundo invisível para a outra. Mas se compartilham, por um acaso. Se mostram vivas. Não consigo achar banal, por mais corriqueiro que seja. Eu me emociono, no sentido abrangente da emoção. Ou no sentido de ver. Eu vejo. Não consigo não olhar no olho da pessoa que passa por mim, não perceber suas feições, não observar seus gestos, seu andar, se as vestes realmente a vestem. Penso no que pensa, pra onde vai, de onde vem. Se tem fome, se está amando, se o sapato está machucando. Imagino sua voz, seu sorriso, sua profissão, sua nudez. Penso se me pensam. Penso se fôssemos conhecidos, amigos, amantes ou rivais. Mas não deixo de notar meus transeuntes. Acolho meus personagens. Busco uma vida nos olhos vidrados virados pra dentro. Não olham pra mim. Não percebem que passei. Não observam minhas pernas tortas, não viram que eu vivo. Não notam que já não nos veremos mais. Também não te vêem, não te riem, não te imaginam. Estão vendados. As formigas se notam, os cachorros se cheiram, a gente nem passa, transpassa. Eu continuo olhando nos olhos, criando vidas, inventando choros, apressando mortes. Continuo me emocionando com a displicência forjada desse momento exato capaz de trazer duas pessoas por apenas um instante, para o mesmo mundo solto, para nunca mais. Um piscar. Outro piscar e perco você. São muitos personagens novos e vivos para apenas dois olhos atentos. Queria ter mais olhos, então. Com zoom.

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